quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Mas afinal, o que é quimio-informática?

A Quimio-informática é uma área emergente que utiliza métodos computacionais para problemas de Química. Tem sido intensamente utilizada pela indústria química e farmacêutica na descoberta de novos produtos e tem trazido interpretações novas a questões científicas fundamentais. A presença destes conteúdos no ensino universitário da Química em Portugal é escassa e a sua incorporação ao nível da graduação e pós-graduação deve ter em consideração: a) o panorama nacional e europeu de emprego para químicos e cientistas; b) que muitos destes métodos passaram já para o núcleo dos métodos básicos da Química. Neste artigo são lançadas pistas de reflexão sobre o assunto.

A quimio-informática

A rápida disseminação de suportes electrónicos para arquivo de informação, o desenvolvimento da instrumentação laboratorial, nomeadamente no sentido da automatização e da miniaturização e o aparecimento de novas técnicas como a química combinatorial e HTS (high-throughput screening) provocaram nos últimos anos uma verdadeira explosão na produção de informação química. Uma empresa farmacêutica média que realize HTS pode produzir resultados de dezenas de milhar de experiências por dia. O Chemical Abstracts adiciona actualmente cerca de 900 000 novos compostos por ano à sua base de dados. Isto requer tecnologias eficientes para arquivo e acesso a dados; o problema mais sério que se põe é o de como, para uma dada aplicação, desprezar o ”ruído” e usar a informação útil. Mais ainda, a utilização desta informação permite estabelecer correlações, aprender, extrair conhecimento, objectivos que só são alcançáveis usando metodologias computacionais e de inteligência artificial. Por outro lado, a Internet trouxe possibilidades inovadoras de comunicação, de colaboração à distância e de acesso a vastíssimas fontes de informação, o que tem contribuido para a implementação de estratégias de representação e manuseamento de informação específicas da Química. Simultaneamente tem-se observado um extraordinário incremento do poder computacional e uma notável sofisticação das técnicas de computação em Química. A modelação molecular tornou-se clássica, ganhou honras de prémio Nobel e a “Química Teórica” estabeleceu-se como um reconhecido ramo da Química. Os frutos obtidos em todas estas frentes estão acessíveis ao químico experimental comum através de software de fácil utilização para os sistemas operativos que lhe são familiares e através de interfaces WWW. São ferramentas que invadiram gradualmente os laboratórios (e os universos mentais) e que se estão a impor mesmo aos químicos avessos à modernidade electrónica. Mas são utilizadas na maioria dos casos como caixas negras que ora fazem milagres, ora produzem resultados sem sentido! Discute-se que nome dar a esta área nova, na fronteira entre a Química e a Informática, que aplica e desenvolve sistemas de informação, algoritmos, técnicas computacionais e métodos estatísticos para problemas de Química. “Cheminformatics”, que aqui traduzo por Quimio-informática, é a designação que vai sendo mais consensualmente aceite. “Química Computacional” é uma expressão ainda usada como sinónimo, embora seja normalmente conotada com a utilização de software (como o Gaussian, MOPAC, DOCK, Autodock,...) para modelação molecular. Em todo o mundo industrializado, a indústria química e farmacêutica que faz investigação e desenvolvimento, utiliza fortemente recursos de Quimio-informática, mas tem dificuldade em encontrar especialistas na área. Os informáticos raramente têm apetência para a Química e os químicos sabem normalmente muito pouco de Informática. Para suprir estas necessidades, estão a implementar-se rapidamente cursos de mestrado em Quimio-informática, sendo os pioneiros os da Universidade de Sheffield (Reino Unido0. UMIST (Universidade de Manchester, Reino Unido) e IUPUI (Universidade de Indiana-Purdue, E.U.A.). A nível de pré-graduação, incorporaram-se já disciplinas de Quimio-informática em numerosas Universidades. E enquanto tudo isto acontece, que adaptações sofrem os conteúdos das licenciaturas de Química nas Universidades Portuguesas ? Que formação é proporcionada aos alunos portugueses nestas tecnologias ? Não são tecnologias futuristas, nem distantes, nem inacessíveis, nem caras… São exigidas por qualquer químico que queira hoje produzir um relatório, manusear um espectro, fazer pesquisa bibliográfica, analisar resultados obtidos, fazer previsões para os problemas que tem em mão… O presente artigo pretende ser, por um lado, uma reflexão sobre as intervenções possíveis e necessárias no campo da Quimio-informática nas instituições de ensino superior em Portugal e, por outro, um contributo para o planeamento dos cursos deste tipo que inevitavelmente vão ser criados.

Introdução

Na gestão de informação, computação, comunicação e edição, a Química usa hoje intensivamente e com uma especificidade muito própria, as principais funcionalidades dos computadores. O aproveitamento da cada vez mais abundante informação química requer o desenvolvimento constante de metodologias novas, que não pode ser feito sem uma forte formação em Química e sólidos conhecimentos de Informática. A existência de uma gama extensa de software para Química exige dos potenciais utilizadores conhecimentos específicos sobretudo ao nível dos métodos envolvidos. Por tudo isto, sugere-se a incorporação de conteúdos de Quimio-informática no sistema de ensino universitário e são propostos temas a tratar nesse contexto.